E se o Acordo de Mar-a-Lago Não Funcionar?

Economia e Finanças

Imagine se os Estados Unidos decidissem taxar investimentos estrangeiros em seus ativos financeiros — ações, títulos corporativos, dívida pública (treasuries) — não com uma tarifa comercial tradicional, mas com uma espécie de “IOF à americana”. Essa cobrança incidiria na entrada de capital estrangeiro, desincentivando investimentos em ativos americanos como parte de uma reestruturação mais ampla do sistema financeiro internacional, proposta por assessores do ex-presidente Donald Trump.

Esse cenário, embora pareça extremo, tem sido discutido por especialistas e aparece como uma possibilidade no plano delineado por Stephen Myren, conselheiro econômico de Trump. A proposta é considerada uma alternativa caso o chamado “Acordo de Mar-a-Lago”, um novo pacto monetário global, não funcione como esperado.

As Etapas do Plano

O plano de Trump para realinhar o comércio e fortalecer a indústria americana é dividido em três possíveis etapas:

  1. Tarifas comerciais: já em prática, visam tornar produtos estrangeiros menos competitivos.
  2. Acordo monetário multilateral: buscaria enfraquecer o dólar ou fortalecer outras moedas, mas é complexo, exige consenso internacional e pode fracassar.
  3. Tarifa sobre capital estrangeiro: medida unilateral e extrema para desincentivar a compra de ativos americanos por estrangeiros.

O Funcionamento do Sistema Atual

Hoje, os EUA importam mercadorias e, em troca, exportam dólares. Isso gera déficits comerciais crônicos. O dinheiro que sai para pagar importações retorna na forma de investimentos estrangeiros em ativos americanos — o que mantém o equilíbrio do balanço de pagamentos.

Economistas como Michael Pettis defendem que esse ciclo, onde o capital estrangeiro financia déficits americanos, alimenta a desindustrialização dos EUA. A ideia seria inverter esse fluxo, taxando os investimentos estrangeiros para reduzir o déficit comercial.

O Racional Econômico da Tarifa sobre Capital

Na contabilidade do balanço de pagamentos, a conta corrente (comércio, serviços e rendas) e a conta financeira (movimentações de capital) se equilibram. Se uma é deficitária, a outra precisa ser superavitária. A proposta de tarifar o capital visa forçar uma redução da conta financeira, o que, por definição, reduziria também o déficit da conta corrente.

Grande parte dos investimentos estrangeiros nos EUA é em carteira (ações, bonds), não em investimento produtivo de longo prazo. Trata-se de capital especulativo, que entra e sai com facilidade — o chamado hot money. Tarifar esse tipo de capital poderia enfraquecer o dólar, tornar exportações mais competitivas e, teoricamente, restaurar parte da indústria americana.

Precedentes e Propostas Legislativas

O Brasil já adotou medida semelhante em 2011, impondo IOF sobre capital especulativo para proteger a valorização excessiva do real. Nos EUA, senadores como Josh Hawley e Tammy Baldwin propuseram leis em 2019 que sugerem exatamente isso: cobrar tarifas sobre compras estrangeiras de ativos americanos.

Mais recentemente, o think tank American Compass também defendeu a proposta, e ela aparece com cautela no guia de Myren como uma possível medida emergencial.

Consequências e Riscos

Apesar da lógica econômica por trás, uma medida como essa poderia ser explosiva para os mercados globais. Investidores internacionais poderiam retirar ou reduzir significativamente sua exposição ao mercado americano, gerando pânico e desvalorização de ativos.

Por isso, ainda que o risco exista, trata-se de um último recurso, improvável de ser implementado, mesmo que o plano original fracasse. O grande problema, segundo analistas, é que o plano tenta corrigir os efeitos do sistema atual sem tocar em sua causa raiz: o dólar como moeda de reserva global.


Quer saber mais sobre como isso pode impactar seus investimentos? Deixe seu comentário ou assine nossa newsletter para não perder as próximas análises.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *